segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Salto com Vara

Um toque no botão da TV e estou torcendo pelo Thiago Braz, voando impressionantemente no salto com vara. "Como será que tiveram esta ideia de usar um bastãozão pra se jogar, que depois virou esporte?" - penso. Estou feliz e impressionada, mas n deixo de notar o rosto do francês que tenta, apesar das vaias e da pressão de já ter errado, acertar naquilo que mais sabe fazer, tentativa que acaba sendo em vão. A alegria de Thiago e do estádio é contagiante, mas n o suficiente pra n despertar certa compaixão e empatia pela tristeza do francês. É assim que funciona isso de eu n ser uma pessoa competitiva. É assim que é desde que eu era criança...

terça-feira, 2 de agosto de 2016

Dos meninos.

É noite e estou congelando na cama, entre cobertores e o celular, a "quem" me dedico no momento.  No primeiro barulho que escuto em meu portão, penso se tratar de um dos muitos cães que por aqui passeiam, mas logo escuto palmas. De longe dois meninos, e um deles pede água. Ainda com a tese da presença canina, que logo seria refutada, reflito rapidamente e decido pegar um copo. Não encontro um descartável e encho um copo comum, enquanto penso no quanto seria ou não adequado eu ir levar o copo com uma faca. Não tinha msm intenção de abrir o portão, mas me ponho mais à distância ainda da grade ao perceber que existe uma terceira pessoa atrás da pilastra. Só quando um dos meninos já bebeu metade do copo outro se revela, timidamente, na esperança de dividir a outra metade da água com um dos garotos. Eles agradecem, dizendo que seria ruim correr até lá (não explico o lá, mas penso que seja a casa de algum deles), e que estão treinando maratona para as Olimpíadas. – "Quem sabe um dia vocês vão? Mas correr nesse frio, vcs vão congelar aí fora!", digo rindo, entre me achar estúpida por ficar apreensiva com garotos e me achar estúpida por me arriscar a interagir com eles.  Tenho vontade de avisar para que n façam mais isso, que podem ser envenenados por algum maluco, e que podem assustar as pessoas, e todas essas coisas que a cultura carioca que me proibiria até mesmo de morar em uma casa tão acessível assim ensina.



Virgínia Levy é carioca e mora em Florianópolis há 2 anos. Jamais imaginou morar em uma casa sem a proteção do interfone, da campainha e do olho mágico até vir parar esta em que se encontra atualmente, e estranha bastante o costume local de largar portões e portas abertos, sem trincos. 

segunda-feira, 25 de abril de 2016

O feijão e o sonho

Como que saída do livro de Orígenes Lessa, não podia deixar de pensar no quanto seria bom se verso enchesse barriga. Por mais que não vislumbrasse uma possibilidade real de que sua expressão pudesse lhe garantir o sustento, não podia deixar de pensar: "Não enche barriga???? Pois transborda barriga!!!" . Era sempre quando não cabia em si que transbordava para a escrita. Daí a compreensão da náusea sartreana. Não poderia mesmo entupir-se desta maneira, buscando fazer do que a enchia algo que fosse se converter em alimentos. Quando precisava escrever, era (, ao menos, um pouco,) de esvaziar-se que carecia.

Em duas partes

Narrativa construída pela autora. Trindade.

Por ironia do destino, em um caminho familiar de outrora que é agora bem distante do que agora é de ambos, viu-a através de seu carro. Caminhava apressada, algo entre trôpega e imponente. Envolvida que estava em seus pensamentos, a mulher tinha personalidade forte, marchava com vigor e sequer se apercebia dos olhares que atraía ao passar. Não se preocupava com esses olhares. Tinha outras coisas com que se preocupar e direcionava-se sempre a elas.
"Que tipo de idiota perderia uma mulher dessas?" – perguntou-se, quase ao mesmo tempo em que respondeu: "Eu perdi."


Narrativa biográfica do momento da autora. Campeche.


Não era a primeira vez que escrevia sobre algo que não acontecera com ela mesma, mas era a primeira vez que escrevia em terceira pessoa. Ou melhor, em primeira, porém outra. Primeira terceira pessoa, álter ego, eu lírico, outro, Outro. Pensou que gostaria de escrever poemas eróticos. Balançou a cabeça de forma reprovativa ao perceber que havia pensado em pseudônimos. 2016 e alguém ainda se envergonha de textos eróticos! Achou absurdo, mas concluiu que um heterônimo podia ser uma boa ideia. 

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Incompreensão


(Incompreensão é quando vc não sabe se foi agredido ou não)

A desgraça é saber que se apanha de graça,
 nos meandros que a vida traça,
 e que, enquanto (a gente) disfarça,
a vida, esta grande reaça,
 não deixa nunca de te fazer de palhaça...

terça-feira, 5 de abril de 2016

Ensaio sobre a vergonha - Primeira Tentativa

A vergonha é um processo
Ou melhor, um procedimento:
Imobiliza-se o ser no momento
Impede-se qualquer acalento
Aprisiona na angústia, no momento
Faz avanços no retrocesso

Excesso de percepção de si
Ou excesso de exposição ao outro
que segue presente, mesmo que a 1 km
da distância que havia
não posso dizer que esqueci.

E como segue o tormento
no caminho adulterado pelo ônibus errado,
segue também o lamento.


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Este texto foi escrito em um ônibus para Canasvieiras, que peguei por engano enquanto voltava (nervosa e envergonhada) pra casa após a entrevista do processo seletivo para o Doutorado. Consegui ser aprovada, mas continuo detestando entrevistas! Na ocasião, o título que propus foi: "Excesso - ou Das vezes que peguei o Tican para ir ao Ticen para ir ao TiRio".

Gaúchos – ou Minha Experiência com o Preconceito

Levantou-se, não sobressaltada, mas tendo dormido bem menos que o de costume. Algo além de um desconforto (uma sensação de ter revelado algo que surpreendia a si mesma) permanecera durante o sono e agora decidira interrompê-lo. A mente (o espírito) queria pensar acordada.
Dois anos haviam se passado desde que se estabelecera em Florianópolis. Dois anos desde que começara a conviver na cidade e, desde então, experiências se acumulavam. "Escreveu errado? Deve ser nordestino"; "Parece que os existencialistas vão diminuindo no Brasil à medida que aumenta o sol"; "Lá no Rio Grande" (tem outro no país, sabia?). Para piorar circulava em ambientes acadêmicos. Ambientes acadêmicos, como bem se sabe, são grandes concentradores de pessoas arrogantes – aquele tipo de pessoas que jamais suportara. Entre os relatos autocentrados, cheios de si, competitivos, que buscavam apenas retroalimentar a vaidade de quem fala e não promover uma troca de ideias entre si, um sotaque que não engava: RS, ou interior de SC (em alguns lugares do interior de SC, as pessoas se acham mais gaúchas que os próprios gaúchos...).
Pensou em Pomerode[1] e sua supremacia na taxa de suicídio nacional. Pensou na explicação que ouvira sobre isso: cultura competitiva, individualista, baseada no "ter", "consumir" e não no "ser". Sentiu uma certa dose de pena das pessoas que acreditam realmente que o fato de alguém não possuir um carro diz algo sobre o valor daquela pessoa.
"Apita" o celular e, dispersa pelo desejo de atendê-lo, percebe que a mente faz novos caminhos que distorcem o sentido original de sentar e escrever um texto: a percepção de que, para fugir das posturas preconceituosas, tinha formado, sem querer, uma espécie de "preconceito reativo", mas não acreditava que isto pudesse ser algo bom. Preconceito não é algo bom, e ser injusta com um monte de outros gaúchos não soberbos também não. E não podia se deixar envolver pelo horroroso jogo da competitividade! É bem verdade que ainda lhe chocavam os relatos de desconhecimento das contribuições importantíssimas de pessoas de outros estados, desconhecimento que reforçava a crença de que sulistas sejam melhores; mas negar e ir para o extremo de que, na verdade, são os piores, também não empoderaria ninguém.
Não conhecia mesmo, era verdade, muitos exemplos de feitos importantes de pessoas do Sul, não compreendendo, por isso, a suposição mítica de que seriam pessoas melhores simplesmente por descenderem de europeus (quem disse que são só os sulistas, e quem disse isso quer dizer alguma coisa?). No entanto, decidira que devia conhecer, e não se guiar pela avareza cognitiva que sempre nos leva a operar a partir do mínimo possível de informação, fazendo julgamentos tendenciosos. Será mesmo protetivo ficar sempre com um pé atrás, evitando se chocar novamente da próxima vez que algum comentário arrogante e preconceituoso vier? Ou será uma postura que atrapalha a interação, dificultando ainda mais os processos de troca que poderiam levar a pessoa a reconhecer, envergonhar-se e refletir sobre seus preconceitos para lidar de forma melhor com eles, como faço agora?

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Virgínia Levy é psicóloga, carioca, de mãe baiana e pai carioca. Mora há 2 anos em Floripa, e se surpreendeu ao perceber que estava reagindo ao preconceito com preconceito contra os preconceituosos, o que acha péssima ideia. Conhece muita gente boa e ruim de toda parte do planeta, e reconhece isto, mas estará secretamente querendo te dar um soco se você estiver sendo arrogante, se vangloriando (sobre qualquer assunto). Entre acordar e efetivamente escrever o texto que lhe motivou a levantar da cama hj, viu um texto que falava do empoderamento feminino por via do reconhecimento dos atributos pessoais, e pensou que o orgulho separatista do sulista de hj pode ter sido o empoderamento do oprimido de ontem (pela Coroa Portuguesa).




[1] Município de Santa Catarina. 

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

9 dias sem beber

O que descobri:
- Não sou viciada em bebidas! Huhuuuu!!!
- Sou viciada em gente. Merda. u.U

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Isso foi drama. Na verdade estou sendo habilidosa com esta "compulsão" tb ;-)

Dos escritos perdidos

Animada por aquele frisson que sempre vem depois de um post publicado, pus-me a procurar poemas sobre vc, última paixonite. Tinha a impressão de que havia deixado de publicar algo, como sempre deixo qdo aquilo me afeta a tal ponto que me sentiria afetada demais se publicasse. Enquanto escrevia isso, senti-me satisfeita ao pensar que o encantamento meio que havia passado. Como é bom esse lado leonino, de apaixonar-se e desapaixonar-se com tamanha rapidez!



(Não sabendo precisar, situo em jan/2016 os poemas que pensei em procurar e desisti).
- Mas, Virgínia, vc devia ser organizar pra fazer um livro.
- Bem, acho que já está feito: vc nem imagina qto, com esse ato de escrever, do qto eu me livro. ;-)

Carioquizações no TiRio-TiTri (16/02/2016)

Ver a fila do TiRio-Titri em plenas férias foi surpresa, mas n tanto qto o fato de a última da fila confirmar que se tratava do 847. Eqto pensava no quão carioca era se referir ao ônibus no Rio, tomo qqer lugar no ônibus cheio (porém, longe de estar lotado) e só qdo uma menina vai descer reparo em seu uniforme do Colégio Estimoarte. Penso na raridade de pegar ônibus lotado aqui e na arte de ficar em pé ao lado de alunos do Cefet-RJ para sentar no lugar deles qdo desciam ao passar pela escola, poucos pontos antes de minha entrada e muitos antes do bairro de Botafogo, onde eu desceria para ir ao trabalho. Entre o Rio Tavares e a Costeira, poucas lembranças me remetem ao passado recente e me direcionam ao futuro. Percebo que o elo entre tais experiências não é outro senão eu mesma. Eis de que sou constituída - dentre outras coisas, de artes urbanas, trânsitos e "busões"...

Sobre Naná (e paciência)

Eu, às vezes, tenho muita (até demais); outras vezes, nenhuma. Mas meu celular tem, não restam dúvidas, olha lá: "Solitaire". O meu celular tem paciência!!! Me ponho a jogar e não deixo de lembrar da minha avó. Incontáveis noites jogando paciência. Madrugadas. Dias. Além do impressionante fôlego para viagens, até o fim da vida (vinha da Bahia ao Rio e vice-versa uma, duas vezes por ano, até mais de 80 anos, se não me falha a memória), a senhorinha tinha uma impressionante capacidade de se entreter sozinha. Não era conhecida por ser extremamente adocicada, ou politicamente correta; ao contrário, trazia no rosto a marca dos que não são muito afeitos a esconder suas percepções e discordâncias. Ainda assim, impaciente ou não, apaziguava-se jogando Paciência - ou assim imagino. (Será que jogava com a paciência tb?).
Lembro-me do olhar crítico e surpreendente diante do mundo: "Ana Carolina diz que é bissexual. Isso é a mesma coisa que dizer que comeu feijão ontem. Pra que é que eu vou querer ler isso?".
"Imagine o dinheiro pra trocar essas placas do Banco do Brasil pra botar 'Banco de Maria', 'Banco de João'. Não serve pra nada. Pra quê que eu vou querer 'Banco de Naná'? Vai mudar em quê pra mim?".
"Aí um monte de velhinha analfabeta e a Pastoral da Igreja resolve fazer um amigo oculto de cartão de natal! Pra quê? Por que não dar um paninho, uma coisa que todo mundo vai gostar de ganhar?".
Guardava com carinho essas pérolas/lições e não tinha percebido, até hoje, que saber se entreter sozinha é que tinha sido a maior lição deixada. Se entreter sozinha, treinar a paciência e ditar a vida pelo próprio ritmo, cismando de viajar quando achasse que tinha "precisão" (que era preciso). Eis lições que eu não tinha percebido mas que sempre estiveram ali, ao meu alcance, graças à presença controversa da minha avó...



(P.S.: Sem injustiças com minha outra avó, nem com minha madrinha/avó que era tia-avó. Apenas algo que percebi hoje, jogando paciência.)

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Sobre Carnaval e Sensibilidade

Primeiro carnaval longe da família. Lembro de quando era criança e sentava com minha mãe para trabalhar em cima do conceito da fantasia.  Perguntava de que queríamos nos fantasiar e sentava para desenhar a fantasia. O próximo passo era ir pra alguma área de comércio popular, como a feirinha entre Pavuna (último bairro do Rio, em que morávamos), e São João de Meriti (o município do outro lado do Rio). Então comprávamos aquilo de que precisávamos e purpurina e estrelinhas, às vezes tb confetes. Não sei como minha mãe não se tornou estilista.
Lembro do primeiro carnaval em Vila Isabel, passado distante eternizado em uma fotografia onde apareço com pernas tão magras que me dá agonia. Nada contra pernas magras, ou gordas: o jeito que foi feita a foto faz parecer que eu estou alongada de modo artificial (ou assim são os corpos dos adolescentes). Da briga em casa entre Salgueiro e Mangueira, viramos tds Vila. Logo vieram os anos deprimidos, qdo eu nem conseguia me mexer. O carnaval dava vergonha. Viver dava vergonha. Eu era a própria vergonha ambulante, até que estamos na rua e somos chamados pro desfile que fomos ver. Herdeiros da Vila. Desfilei muito feliz na Escola de Samba Mirim, e foi triste quando não havia fantasias que coubessem em mim para que eu desfilasse, bem no último ano em que poderia. (Em escolas mirins, os componentes podem ter no máximo 16 anos, a menos que sejam da bateria – aí podem ter até 18). Entre lembranças de lindos desfiles, guardo com carinho os desfiles pela Unidos de Vila Isabel, a gravação do coro da comunidade, a apuração na quadra na vitória de 2013. Na Vila não se cobrava mais dinheiro pelas fantasias, e sim presença em ensaios que iam progredindo de 1 a 3 vezes por semana, de outubro ao carnaval. Virávamos família.
Hoje estou longe do Rio. Não que não exista carnaval aqui; na verdade, enquanto escrevo olho pras roupas com as quais estou prestes a improvisar fantasias, como sempre fiz com as amigas queridas quando o sol me permitia. (Escrevo isso e lembro do tempo em que não tinha alergia nenhuma e era carnaval de rua de noite e praia de dia. Como era lindo! E como faz tempo! Sorrio pensando que o filho da vizinha que era um garotinho pulando no mar da minha lembrança já é pai.).
O que talvez não exista é a sensibilidade. Ou o carinho. Carnaval era amor, é amor, sempre foi amor. Dói quando falam mal do meu amor, quando se torna bonito difamá-lo, ofendê-lo! Dói quando chamam se festa de hipocrisia, de festa de fingir que tudo vai bem e tds as pessoas são infelizes, pq é exatamente o contrário, pra mim. Carnaval é sair de si para resgatar a si mesmo. É lembrar que tudo isso que nos engessa é ilusório, que nada nos imobiliza se nos dispusermos a nos mover no sentido de fazer tudo. Em um mundo tão bruto, seco, áspero, nada melhor que se reunir com pessoas queridas para cantar e dançar (mesmo que as piores músicas, com os piores banheiros e as piores cervejas!), deixando de lado aquela força estranha que nos compele à grosseria, aos maus tratos. Mais amor, por favor! Mais gentileza desinteressada. Mais sensibilidade. Que a festa da carne é, primordialmente, uma festa da alma.
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(Virgínia Levy é carioca e, acostumada com os carnavais do Rio, passa, em 2016, seu primeiro carnaval em Florianópolis-SC. Compreende que a vida sem sensibilidade, leveza e afetividade é sem graça e milita na resistência contra a brutalização das relações humanas.)