terça-feira, 29 de outubro de 2019

Merecimento e Dor


Eqto eu escrevo, uma parte ferve, perto do meu ombro. Estou dentro de casa e a quantidade de sol é irrisória. E, além disto, eu estava mto longe da janela, então não há msm motivo pra uma reação ao sol agora. O fato é que me lembrei agora, e chorei, pelo que me lembrei ontem. N sei qts anos eu estava fazendo. Lembro bem do aniversário de 6 ou 7 anos; os outros confundo um pouco. Mas havia tb, no mesmo bairro, um aniversário de 15 anos. Não sei se não fomos convidadas ou se minha mãe resolveu não ir por causa do gasto com roupas, que é mais alto pra esse tipo de evento, ou ainda se simplesmente não achou adequado, ou se não previu o que ia acontecer. Lembro bem que minhas primas (sequer lembro quais!), que moravam longe, estavam na minha casa apenas pra ir nesta festa, e falavam nela o dia inteiro. Acho que foi quando aprendi que um aniversário de 15 anos é uma festa mais elaborada. O absurdo está na presença das minhas primas na minha casa para ir a uma festa que não é a minha. Nem sei se não confundo em colocar estes eventos no mesmo dia (e talvez fizesse algum sentido pra mim que fossem pra outra festa, pq eram bem mais velhas); mas, do que tenho certeza, é que tive uma festa de aniversário sem convidados, porque as pessoas foram pra outra festa. Pra não dizer que não houve convidados, uma amiga da minha mãe apareceu com suas filhas, mas a mais velha, que era de uma idade próxima, era muito chata, e eu sempre me sentia tendo que me submeter às vontades e julgamentos dela pra poder brincar. Por fim, passei uma parte do tempo indo sozinha até a porta, abrindo e fechando, no que era repreendida por minha mãe. Talvez eu realmente corresse o risco de prender o dedo ou quebrar a porta, como ela devia pensar. O que ela não sabia é que eu estava brincando de receber convidados. Fingia que chegavam, que os cumprimentava e deixava entrar.
Hoje, adulta, sempre tentam me convencer de que basta ser eu mesma que as pessoas certas chegarão até mim. Concordo, racionalmente, e até convenço outras pessoas do mesmo. No entanto, no mais íntimo do meu ser, e mesmo em esferas menos profundas, diante das mais variadas experiências, fica o aprendizado da criança que jamais entendeu o abandono, ou o que teria feito para merecê-lo. Fica a sensação de não ser acolhida, de poder se deixada de lado a qualquer momento por alguma razão que sequer posso mudar, pq sequer compreendo. Deve haver algo de errado comigo, algo de ruim em mim, que não sei o que é, que justifique o desprezo. Talvez eu esteja, a vida inteira, procurando este algo, e por isso sempre ache que o encontrei a cada momento em que algo me acontece; talvez por isso que, diante de qualquer dificuldade ou tristeza, seja tão fácil eu me admitir culpada sem saber do q, merecedora de toda e qualquer rejeição.

sábado, 19 de outubro de 2019

Diário de uma pessoa ansiosa. Dia 1.

São 16h57 e n sei q horas comecei, mas 12h09 já estava nessa: passar pano na casa inteira. Acabo de terminar. O tempo n parece jus à minha quase quadrada quitinete: uma pequena cozinha, um banheiro e o espaço que divido com cama e sofá. Penso no tempo gasto por minha mãe cozinhando e limpando, msm q n tenha escolhido, msm q jamais quisesse. Agradeço-a mentalmente. Nesta q é a última das pausas com mtas dores nas costas, curiosamente sempre acompanhadas de pensamentos de mágoa e rejeição os mais aleatórios, sobre as mais aleatórias pessoas, o jogo é n pirar com a máquina de lavar. Estava mto orgulhosa de arrastar pra limpar, mas o delicado arranjo entre a parede da cozinha e do banheiro ficou comprometido. Agora a máquina pinga. Fecho o registro, pois viajo amanhã e tentar usar mais veda rosca de nada adiantou. A paranoia, porém, agora mora no transformador da geladeira, tão próximo da máquina. Consigo espantar pensamentos do qto sou burra, imprestável e consigo terminar a limpeza. Ao invés da insatisfação, porém, a dúvida: a casa vai pegar fogo ou alguém vai ser eletrocutado por causa de uma poça q se formará com os pingos da máquina e chegará ao transformador? Ou ele queimará uma caixa de papelão que eu colocasse embaixo para evitar seu contato com a possível água? 19/10/2019. Diário de uma pessoa ansiosa.

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Escrita autêntica

"Sei que vc escreve poemas de amor!" Tremi por dentro, talvez tb por fora. A confirmação do "eu li o que vc escreveu na dedicatória do livro para..." transformou a vergonha inicial em um sentimento estranho, um outro tipo de vergonha. Tão diferente que muito tempo (quase um ano) foi preciso pra que eu expressasse, mesmo que a compreensão não tenha demorado tanto assim.
Eu, que sempre tive vergonha do que faço de bom, ou do que os outros dizem que é bom e eu, sempre insegura, fico olhando sem saber o que dizer, tive nesse momento uma vergonha diferente. Nem sei se é bom o que eu escrevi e não lembro; provavelmente acharia piegas, com esse meu lado machão que (se) esconde (de) sentimentos no grito, na piada, no tapa, se for preciso. "Garota arisca", sempre disse minha mãe, mas também "muito carinhosa". Que loucura, as duas numa só...
O fato é que, agora, a vergonha não estava em ser pega no flagra em um romanticismo, nem em ter um texto sob olhos sempre avaliadores de leitor, nem mesmo na dúvida sobre a qualidade do poema.
A vergonha estava na farsa de ter escrito por encomenda de alguém que eu não amava.

Queima de móveis.

Do alto da segurança burguesa do décimo andar, quase escrevi um post cômico falando de pudim. Imaginei que logo enjoaria com o cheiro que entrava pela janela e que o vizinho responsável pelo cheiro de pudim queimado teria que vir me dar um remédio e segurar minha cabeça enquanto eu vomitava.
Não sei quanto tempo se passou até que eu soubesse que não era pudim, que alguém tinha queimado o sofá do mendigo. Pessoa em situação de rua. Nesse momento, a linguagem mais carregada de estigma talvez exprima melhor a vulnerabilidade de alguém que hj vi sentado pleno em um sofá, e hoje mesmo o sofá não existe mais.
Fico feliz por não ser o tipo de pessoa que queimaria o sofá do mendigo. No entanto, em momentos como esse, é preciso ser muito mais.

sábado, 23 de fevereiro de 2019

Manhãs de sábado têm algo que eu desconhecia.

Olho o brilho do céu com estranheza. É difícil de assimilar quando a mudança é de outra ordem. Se eu a forçasse, faria sentido, mas, quando o mesmo corpo que gritaria e espernearia por ter que acordar às 9h começa a despertar espontaneamente antes das 8h, a gente fica perplexa. 
Não que eu já não amasse, desde criança, esse brilho intenso, penetrante, mas sutil, que só dá as caras bem bem cedo. Não estou forçando nada. Curiosamente, no momento em que estou mais aberta a ouvir o que o meu corpo quer, o que ele quer é acordar cedo, e quer até dar uma caminhada. Não me (re)conheço.
Qto tempo passei sem um café da manhã decente? Mesmo com cores tão bonitas neste dia, ainda estranho um pouco a minha decisão de caminhar e ir comprar pão. Resolvo ir contando os segundos: são 120 elefantes, ou seja, 2 minutos. (Desde a aula do Paulo na oitava série, me acostumei a contar os segundos em elefantes). No campeche a "manada" seria de pelo menos 1800 segundos para um pão matinal. Eu teria ido comprar pão se ainda morasse lá? Vai saber...
O bom é que numa manhã de sábado o mercado está bem vazio, o que me dá tempo pra conversar com a caixa. Sua filha já tem um ano? Não, ainda vai fazer 2 anos que moro aqui no próximo mês, e eu me lembro da gestação inteira. Lembro do dia em que ela me deixou ficar devendo; lembro do dia em que comentou (como hj) que eu estava sumida, e eu respondi que, sendo fim de mês,a gente não tem dinheiro pra ficar indo em mercado rs... Era a mais pura verdade.
Eqto isso, alheia a todos os meus pensamentos, Sophie (será este mesmo o nome?) quer jogar balas no chão, e fica encantada com o fato de que posso me abaixar, pegar e devolver pra ela. Como qqer criança desta idade, anima-se com esta possibilidade, e inicia um jogo de arremessar pra ver pegar. Despeço-me rindo, e imagino que está indignada pq disse "tchau" e, portanto, vou interromper o jogo; mas sua mãe me explica que, como gesticulei em sua direção, Sophie entende que é hora de vir para o meu colo. Com a permissão da mãe, pego Sophie, e ganho o dia. Sol matinal e criança sorrindo no colo. Obrigada, Vida! Vc n vai ser sempre fácil, sempre good vibes, mas este combo energético pela manhã foi um baita presente!
Manhãs de sábado têm algo que eu desconhecia.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Dia roxo

Florianópolis, 19/02/2019. 

A cor do céu é o que me chama pra janela. Tons arroxeados e azulados, que contrastam com o os dias brancos e cinzas, ou azul-amarelo-rosados que tenho visto quando o sol se põe neste início de ano. As luzes vermelhas enfileiradas são lindas de dia, e percebo que gosto de tds os sons, até das buzinas. Certamente os motoristas dos carros me xingariam por isto; eu mesma talvez xingasse se estivesse num carro e não numa janela. 
Penso com tranquilidade sobre as estranhas alegrias de ser uma criatura urbana, e noto o aspecto pasteurizado de um trecho da Hercílio Luz. Parece bem mais bonito, de longe, um trecho que me dá medo. Não é só o distanciamento, percebo: alguém pintou a ciclovia e, ao que parece, reformou a calçada. Pq só naquele trecho?
É no meio do fluxo de pensamentos sobre gentrificação que minha atenção é atraída por pessoas correndo. Noto que são meninos, com uniforme esportivo. Daria uns 13 anos para os primeiros. É engraçado pensar o que os pais pensariam se pudessem observar o percurso: corredores da escola, calçada com usuários de crack (que observam calmos a invasão de seu "domicílio"), porta do puteiro, corredor da escola novamente... O que ofende mais, falar puteiro e aderir linguisticamente a termos carregados de misoginia, ou falar prostíbulo e mascarar a realidade crua?
Noto então que alguns dos rapazes não correm: andam e conversam. - "É pra correr, porra!". Escuto o grito e não identifico de onde vem; só sei que logo avisto rapazes maiores, de 16, 17 anos, efetivamente correndo.
Quando penso que vão ultrapassar os caminhantes, contudo, param de correr e adentram o Doce Veneno. Logo saem, e entram de novo, animados, em uma versão light do que imaginam que poderiam fazer naquele lugar. Hoje, porém, a satisfação sexual que terão é ter entrado naquele lugar, de onde logo saem, correndo como se jamais tivessem interrompido o treino.
Enquanto isso, o engarrafamento (que aqui se chama "fila") continua, a galera na calçada continua (comovida apenas com algo que parece uma camisa recentemente doada), a matização do céu com novas cores continua, a vida continua.
Não trago, desta vez, nenhuma lição, nenhuma grande sacação; só a realidade nua que tive o prazer de observar. Talvez não haja mesmo nada além disso na vida: discursos polifônicos a se observar. Ou talvez falte evolução para perceber na polifonia aparentemente dissonante algo além da beleza (consonâncias e coincidências a se sentir, a se notar).

sábado, 13 de outubro de 2018

Nem tudo são flores na criação de flores

Escondida dentro do banheiro, comecei a pensar na minha situação, enquanto aquele inseto enorme, do tamanho de metade do meu polegar, e muito mais robusto (e meu polegar é grande), zumbia pela minha sala/quarto. Escrevo sobre a independência de criar as próprias flores à noite e, pela manhã, tenho que me confrontar com o tipo de presença desagradável que elas podem atrair. Penso, por uns 3 segundos, em doá-las - pensamento logo afastado em razão do grau de injustiça de eu não poder ter flores por causa dos insetos. Não podemos, nem eu nem as flores, nem merecemos, passar a vida em uma redoma, nem entrar numa jornada de desistência, rumo ao auto-aniquilamento, apenas pra fugir do medo e das ameaças (reais e imaginárias) dos insetos.