segunda-feira, 1 de julho de 2019

Escrita autêntica

"Sei que vc escreve poemas de amor!" Tremi por dentro, talvez tb por fora. A confirmação do "eu li o que vc escreveu na dedicatória do livro para..." transformou a vergonha inicial em um sentimento estranho, um outro tipo de vergonha. Tão diferente que muito tempo (quase um ano) foi preciso pra que eu expressasse, mesmo que a compreensão não tenha demorado tanto assim.
Eu, que sempre tive vergonha do que faço de bom, ou do que os outros dizem que é bom e eu, sempre insegura, fico olhando sem saber o que dizer, tive nesse momento uma vergonha diferente. Nem sei se é bom o que eu escrevi e não lembro; provavelmente acharia piegas, com esse meu lado machão que (se) esconde (de) sentimentos no grito, na piada, no tapa, se for preciso. "Garota arisca", sempre disse minha mãe, mas também "muito carinhosa". Que loucura, as duas numa só...
O fato é que, agora, a vergonha não estava em ser pega no flagra em um romanticismo, nem em ter um texto sob olhos sempre avaliadores de leitor, nem mesmo na dúvida sobre a qualidade do poema.
A vergonha estava na farsa de ter escrito por encomenda de alguém que eu não amava.

Queima de móveis.

Do alto da segurança burguesa do décimo andar, quase escrevi um post cômico falando de pudim. Imaginei que logo enjoaria com o cheiro que entrava pela janela e que o vizinho responsável pelo cheiro de pudim queimado teria que vir me dar um remédio e segurar minha cabeça enquanto eu vomitava.
Não sei quanto tempo se passou até que eu soubesse que não era pudim, que alguém tinha queimado o sofá do mendigo. Pessoa em situação de rua. Nesse momento, a linguagem mais carregada de estigma talvez exprima melhor a vulnerabilidade de alguém que hj vi sentado pleno em um sofá, e hoje mesmo o sofá não existe mais.
Fico feliz por não ser o tipo de pessoa que queimaria o sofá do mendigo. No entanto, em momentos como esse, é preciso ser muito mais.